Passou-se meu oitavo
aniversario e nada, nem eu me lembrei dele, chegaram às férias do meio do ano e minha mãe
ainda não tinha vindo me visitar, sabia ser temporário e nunca julguei
abandono, mesmo ilhado pelo mar do desencanto.
Tudo estava sereno, quase não se via o carrasco, até os capitães do mato, saíram á passeio e do sobejo do quartel, formou se a pequena legião dos sem opção, era ficar ou ficar e vida que segue.
O trabalho agora leve e prazeroso era pago, remunerado pelo SERPRO, gatos pingados de vários pavilhões, se reuniam no 16 para vedar sacos plásticos contendo
algo sobre imposto de renda com etiquetas com nome e endereço do
contribuinte.
Durou pouco tempo, com o trabalho remunerado a gana de
se ganhar alguns míseros cruzeiros, fez a coisa andar ligeira, foi a fome com a vontade de comer. No fim de cada dia, sobravam elásticos de montão pra nossa prazerosa livre guerra, criamos atiradeiras, arcos, revolveres e protótipos do todo jeito. E veio também o primeiro passeio
coletivo, foi no Forte dos Andradas, quartel do exército no Guarujá. Ninguém
dormiu e madrugada à dentro, ainda no breu da noite os sem opção de três pavilhões se
misturaram e invadiram o Mercedes num êxtase inimaginável. Pela manhã desfeita a cerração, a festa da alma dava vida aos olhos, Roberto
Carlos mostrou claramente os túneis e as curvas da estrada de Santos, misto de medo e prazer ao pensar no mercedão já na curva descendente da idade.
Na
entrada do quartel, um farol no verde, indicava pra seguir pela estrada de mão
única, e o primeiro trecho em que se viu o mar, foi ovacionado com um sonoroso e espontâneo NÓÓÓÓÓÓÓÓÓÓÓ.
Dava medo sentir o
mercedão se arrastando no caminho muito estreito, e olhar pro penhasco lá
embaixo, em certos pontos era mano a mano, o penhasco e o mar.
A areia separava
dois morros, onde canhões cobertos pela mata, apontavam pro mar aberto e pra ilha
de pedras, limite pelo mar da área militar, era o paraíso mesmo o clima não
ajudando, garoava e parava, lembrei-me da Praia dos Amores e só se DEUS refizesse
o lugar pra se parecer com ela, as lembranças traziam um lugar comum que eu desconhecia, Irmão Domingos surpreendeu pela sunga, sem os
trajes habituais e mais ainda, querendo brincar com os menores, todos
desconfiados, fez a escultura de uma
baleia na areia, quis jogar bola e tentou ser amável humano, até que os gritos dos
desesperados guardas, mandando uns menores voltarem da tentativa de chegar a
nado á ilha de pedra, o fizessem tornar-se real sem maquiagem. Foi um castigo leve por serem menores
em férias num quartel e estarem na frente dos oficiais, cumpriram tarefas,
varrer, lavar pratos, sem brincar durante o resto do dia coisas leves, se
lembrarmos..., à tarde seguiu legal, bola, banho, rango e um papo bem
descontraído com os soldados até a hora de dormir. O dia nasceu com sol tímido
em meio a neblina já comum e não sei se por costume ou pela vontade de brincar
acordamos primeiro que os soldados, cuidamos do asseio, café e praia onde
fiquei o dia todo, alguns foram ver os canhões, fiquei no paraíso e meu couro
praiano, fingia não sentir o arder do sol. Tarde, noite vadia, de bola, banho e rango, foi servido um
inédito, simples macarrão, bem temperado, com pedaços de carne moída, que mais parecia um banquete, em nada lembrava os pés de galinha. Antes do sono teve
tempo pra um jogo quase oficial na quadra, entre os nossos melhores e maiores, contra os
soldados, pareceu final de campeonato, o domingão apelido do diretor pela altura e rigor parecia feliz, ou
aliviado pelos internos, no indulto de férias, não parava de exibir a cremalheira serrilhada, feito as de uma rato com dentes miúdos, nosso desempenho de meninos
militares, tinha surpreendido os oficiais positivamente e nem a tentativa de se
chegar à ilha estragou o nosso brilho. Fomos avisados ao chegar de não
nadar pra longe da praia e os soldados no rigor fantasioso do regime vigente do ano de 72, tinham
as ordens expressas para atirar em tudo que se aproximasse da ilha, poderia ser uma invasão marxista pra tomar o poder no Brasil, seriam baladeiras contra canhões.
A madrugada da partida, foi
muito agitada, vez por outra alguém pulava do beliche no dormitório destinado a
nós e corria pra fila já formada na porta do banheiro, onde as latrinas
militares, sem vaso esperavam os estomacais contorcionistas. E foi assim do forte até o começo da subida da serra, onde tinha mato despejamos
macarrão carne e a vergonha, se vazando pelo caminho, e era engraçado, tinha gente que se ajoelhava rogando pra descer, o
mercedão parava e voávamos aos bandos pras moitas, que nem andorinhas em revoada, e da janela os sacanas gritos caguetavam, cagão, cagão, cagão.
Na entrada da velha estrada, o enfado e o ar de tristeza
era geral e perto do cemitério um grito canto, acompanhado de batidas na lataria
e indiferente aos olhos de quem vigiava e poderia punir, troou espontaneamente, quase como revolta, chegamos na gaiola, chegamos
na gaiola, chegamos na gaiola, Seu Matos solava o